segunda-feira, 16 de julho de 2007

Henri - Parte 1.2

Liguei pra ele pela manhã e ninguém atendeu. Não me pergunte pelo por que do pronome. Quem mais poderia estar naquele apertado quarto-e-sala? Para haver passagem no corredor, Henri mantém a custo a porta do banheiro fechada. Valendo-se dessa necessidade, ele aproveitou e pôs um espelho no lado de fora. Ou seja: você toma banho, seca-se todinho às cegas. Só vê a si no final, depois de vestido e enxugado. Embora, se mora sozinho, é provável que Henri ande nu pela casa.

Voltei a telefoná-lo depois do almoço – do horário de almoço em verdade; nada comi o dia inteiro. Ele ofegou e, só então, respondeu curto, grosso e asmático:

“Alô?” “Ah... Sofia? Olá Sofia. Como vai?”

Foi o máximo de interrogação que obtive. Disse-me que certo amigo passaria algum tempo em sua casa por conta de um curso. O amigo, até então, não tinha nome. Henri acabava de chegar de uma corrida com o amigo, agora hóspede, e estava cansado demais para o meu programa. “Eu agradeço o convite” – qualquer que ele fosse, imaginei – “, mas fica para outro dia” – pontuou.

2 comentários:

Anônimo disse...

Henri, contador de 27 anos, se mata em 23 de outubro por causa de seu nome, da Identidade Única imposta. Henri Letzer teria sido vítima de um mecanismo absurdo de criminalização paterna, porque seu nome e sobrenome eram idênticos aos de um famigerado membro da máfia da Calábria. Nascidos e crescidos na mesma cidade, nem de longe eram parentes.

A polícia política o seguia e intimidava, sem trégua e o agora suicida Henri Letzer estaria cansado dos dramas de hotéis na hora de exibir seus documentos, cansado das perseguições e eternas blitzes. Em protesto, suicidou-se, lançando a campanha pela Abolição do Nome Próprio.
Os historiadores não se interessaram pelo assunto.
Entretanto, sua morte só foi possível, graças à minha alta no hospital psiquiátrico e ao fato de que renunciamos ao manicômio do Eu.

Anônimo disse...

Fazemos voto.
O mundo continua mundo. As palavras continuam crocantes. Sofia quem crê. E os telefones...Ahhh os telefones. Malditos sejam estes.

 
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